Na prática, isso significa que o processo de escolha da  empresa contemplada será público (JULIO WIZIACK e FÁBIO FABRINI)

Após a descoberta de um esquema de pagamento de propina em troca da liberação de  valores bilionários para grandes empresas, a Caixa Econômica Federal decidiu  abrir concorrência pública para definir quem recebe o dinheiro da carteira  administrada do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço).

Na prática, isso significa que o processo de escolha da empresa contemplada  com os recursos, antes restrito aos gabinetes da Caixa, passará a ser público.

A promessa do banco é que, com o novo sistema, só os melhores projetos vão  receber o dinheiro do trabalhador e que haverá transparência nas negociações.

A medida, que deve entrar em vigor até o fim de março, é uma tentativa da  Caixa de virar a página da Operação Lava Jato, que revelou o esquema de  corrupção. 

O chamamento público funciona como um pregão. Vence quem dá o melhor lance e  todas as propostas são públicas. Em tese, isso tornaria mais difícil o  favorecimento de empresas com acesso direto a executivos da Caixa ou a políticos  que costumam fazer indicações para os cargos de chefia no banco. 

O ex-vice-presidente da Caixa Fábio Cleto contou em sua delação premiada que  os esquemas atingiram tanto a carteira administrada do FGTS quanto a do FI-FGTS,  fundo administrado pela Caixa com recursos do trabalhador e destina recursos a  projetos de infraestrutura. 

Foram essas revelações que levaram o TCU (Tribunal de Contas da União) a  abrir uma auditoria nos investimentos feitos pela Caixa com recursos da carteira  do FGTS. O caso será julgado pelo tribunal nesta quarta-feira (7). 

Investimentos de R$ 6,6 bilhões em seis projetos foram considerados  irregulares pelos técnicos do tribunal. Desse total, R$ 1,1 bilhão foi destinado  para a compra de papéis de dívida (debêntures) emitidos por empresas de  saneamento (Aquapolo, Haztec e Essencis), além da Linha Amarela (que explora  vias expressas no Rio de Janeiro). 

Os R$ 5,5 bilhões restantes foram para a compra de cotas de dois fundos de  investimento imobiliários --o Convida Suape, em Pernambuco, e o Porto Maravilha,  no Rio de Janeiro. 

IRREGULARIDADES 
 Várias foram as irregularidades apontadas pelos técnicos do tribunal. Na compra  das debêntures, os auditores consideraram que os investimentos do FGTS só podem  ser direcionados para saneamento como complemento de um projeto habitacional.

No caso da Aquapolo, em que os recursos foram para um sistema de reuso de  água em Mauá (SP), o projeto atenderia indústrias, o que, ainda segundo os  auditores, contraria a legislação do FGTS. 

Em sua defesa, a Caixa disse ao TCU que "todas as ações de saneamento em uma  localidade contribuem diretamente ou complementarmente à habitabilidade  residencial da região". Disse ainda que, "em face da crises hídricas (...),  investir no reuso de água (...) será mais do que complementar, será vital e  imprescindível à habitação." 

Sobre a compra de cotas dos fundos de investimento imobiliário Convida Suape  e Porto Maravilha, os auditores concordaram com entendimento do Banco Central de  que o FGTS não pode adquirir --direta ou indiretamente-- cotas desses fundos.

Não se sabe se esse entendimento, porém, será mantido pelo tribunal. A  tendência é que, em ambos os casos, seja considerado irregular a realização dos  investimentos quando já se sabia que a viabilidade econômico-financeira dos  projetos não era sólida e também que não havia transferência sobre o risco  dessas operações. 

Para a equipe de técnicos, em lugar de evitar investimentos temerários ou  exigir garantias complementares, a Caixa aplicou --com dinheiro do FGTS-- em  títulos públicos (corrigidos pela Selic)-- transferindo o risco do negócio para  o próprio FGTS. 

A Caixa informou que a carteira administrada do FGTS é um veículo de  investimento que tem como objetivo adquirir para o fundo ativos financeiros, os  quais são lastreados em operações de habitação, saneamento básico,  infraestrutura urbana e operações urbanas consorciadas, em concordância com as  diretrizes definidas pelo CCFGTS [Conselho Curador do FGTS] e regras do  Ministério das Cidades. 

Em nota, o banco explicou que três resoluções autorizaram o FGTS a adquirir  debêntures, cotas de fundos de investimento imobiliários e de fundos de  investimento de direitos creditórios. 

CONSELHO AGORA TEM RESTRIÇÃO 

 A Caixa se comprometeu com o TCU (Tribunal de Contas da União) a baixar uma  regra que proíbe funcionários do banco de participarem do conselho de empresas  que receberem recursos do FGTS. 

Os auditores apontaram risco de conflitos de interesse porque não existe  regra no banco impedindo que funcionários que participaram da tomada decisões  dos investimentos assumam assentos no conselho das empresas beneficiadas com  aportes. 

Assim, o banco decidiu vetar por três anos que seus funcionários participem  de qualquer conselho de administração ou fiscal de empresas que receberem  recursos do FGTS. 

A instituição financeira entende que passado esse período não há risco de  conflitos de interesse porque a empresa já teria implementado seu projeto. 

SETE BRASIL


 Um exemplo de conflito do gênero ocorreu com a Sete Brasil --empresa investigava  na Lava Jato que administrava a construção de sondas para o pré-sal e hoje tenta  sair da recuperação judicial. 

O FI-FGTS era sócio da Sete, que também recebeu empréstimos da Caixa. O  representante do fundo no conselho da empresa era também um executivo do banco.  Na prática, ele tinha informações sensíveis que afetariam tanto o acionista  (FGTS) quanto a própria instituição financeira, a Caixa. (Fonte: Folha.com)

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