Doisantidepressivos por dia, mais um remédio para dormir. São esses os medicamentosque a bancária Beatriz*, de 42 anos, tem de tomar todos os dias, desde quedescobriu ter fibromialgia e depressão.
Abancária foi diagnosticada com distúrbios psiquiátricas após crises de choro edores constantes pelo corpo todo. Por este motivo, está afastada do trabalho hácerca de seis meses.
“Descobrique estava doente porque quando chegava no banco começava a chorar. Tambémpassei a dormir mal porque acordava de madrugada pensando que algo estavaacontecendo no trabalho", recorda a bancária, que é administradora deempresas.
Omotivo que levou a profissional a ficar doente é cada vez mais comum no setorbancário brasileiro: assédio moral.
Segundolevantamento do Ministério Público do Trabalho (MPT) a pedido do iG, das 3 mildenúncias realizadas em 2013, 30% foram de bancos. De 2012 para 2013, o númerode acusações aumentou 7,4%. O ritmo de expansão do assédio moral no Brasil émaior do que o apontado pelo MPT.
Em2011, 29% dos trabalhadores do setor bancário pediram o fim do assédio moral.Em 2012, o número aumentou para 31%. Em 2013, para 58% – de um total de 37 milentrevistados. Ou seja, o índice dobrou de 2011 para 2013. No caso do assédiosexual, o desconforto é menor. Apenas 3,78% dos bancários ouvidos pela pesquisa(1,4 mil trabalhadores) reivindicam o combate ao assédio sexual.
Segundoestudos, o assédio moral ocorre, em grande parte, por conta das metasagressivas determinadas pelas instituições bancárias.
Acobrança é cada vez mais ambiciosa. Se o trabalhador atingiu os objetivos em ummês, no próximo é cobrado para superá-los. Não há limites, que defende aparticipação de funcionários na elaboração das metas.
Apressão foi um dos motivos que levou Beatriz* a se sentir humilhada. "Eraobrigada a fazer hora extra. Quando não podia trabalhar além do horário,falavam que tinha pouco comprometimento e argumentavam que havia muitosprofissionais que nem eu disponíveis no mercado de trabalho", relata.
Abancária foi demitida do banco após queixar-se das humilhações, mas foiafastada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a pedido do médico dotrabalho durante o exame demissional.
"Nobanco, se você recebe duas avaliações negativas, é mandado embora. É umapressão muito grande", destaca.
Paralelamenteà cobrança por metas, o setor bancário extinguiu 10 mil postos de trabalho em2013, segundo estudo do Departamento Intersindical de Estatística e EstudosSocioeconômicos (Dieese).
Profissionaisvítimas de assédio moral podem desenvolver doenças físicas e psiquiátricas
Apesardo enxugamento no quadro de funcionários, o lucro líquido dos bancos cresceu R$1 bilhão em relação a 2012, atingindo R$ 60,6 bilhões, informa o Banco Central(BC).
Noentanto, em 2013, a relação entre rentabilidade e patrimônio (sigla ROE, nojargão financeiro) dos bancos fechou com 11,97%, queda de 5,06 pontospercentuais em relação a 2012, segundo a consultoria Economatica. Esteindicador avalia a rentabilidade das empresas.
"Osetor bancário é o único que tem ferramenta de conflito de trabalho naconvenção coletiva. Temos um canal onde o trabalhador pode denunciar casos deassédio moral. O banco, ao receber a denúncia, vai retreinar o gestor outransferi-lo para evitar que esse problema volte a ocorrer", defendeMagnus Apostólico, diretor de Relações do Trabalho da Federação Brasileira deBancos (Febraban).
Segundoo diretor da entidade, a federação recebeu 42 denúncias em 2011 — quando ocanal foi lançado. Em 2012, 119. No ano passado, esse número aumentou para 171– alta de 43,70% em relação a 2012.
"Aalta expressiva se deve à entrada de um grande banco [no acordo] e ao maioracesso dos trabalhadores à ferramenta. Hoje, eles se sentem mais confortáveisem reclamar", explica.
Naavaliação do diretor da Febraban, as metas não são responsáveis pelo aumento doassédio moral. Isso porque, segundo ele, o índice de rotatividade do setor ébaixo.
Oque fazer ao setor vítima de assédio moral, em ordem?
1-Converse com o gestor com uma testemunha ao lado
2-Faça uma queixa no canal de denúncias do banco
3-Entre em contato com o sindicato da categoria
4-Denuncie o caso ao Ministério do Trabalho ou ao Ministério Público do Trabalho
5-Entre com ação judicial contra o banco
"Osetor bancário é um segmento que roda pouco e mantém as pessoas no trabalho.Nossa rotatividade é de 4,5%", defende o executivo da Febraban. Pesquisado Dieese mostra que o índice de rotatividade no País em 2012 (últimodisponível) está em 64%.
ParaRicardo Carneiro, procurador do Trabalho e gerente nacional do projeto"Assédio é Imoral", o profissional que sofre assédio moral geralmenteteme perder o emprego ao realizar uma denúncia.
Poreste motivo, o MPT realizou uma campanha nacional em 2013 com foco no assédiomoral dos bancários. O objetivo era que os trabalhadores se sensibilizassem edenunciassem casos de abuso a algum órgão, como o próprio MPT.
"Aspessoas estão conhecendo mais o que é assédio moral e, consequentemente,defendendo com mais força os seus direitos", destaca Carneiro.
Saúde
Casosde assédio moral não agridem apenas a integridade do funcionário, mas tambémpodem causar danos à saúde física e mental do profissional, alerta Maria Maeno,médica da Fundacentro, do Ministério do Trabalho.
"Asvítimas de humilhação podem ter desde mal estar e depressão, até problemasgástricos, hipertensão e anorexia. O tratamento deve ser feito com psiquiatra,medicamentos e psicólogo, e pode levar anos", aconselha a médica.
Olharpara o trabalho de forma negativa é o primeiro sinal de que algo não estácerto, afirma Maria. "A tendência de quem sofre assédio moral é ter repulsaao trabalho. Não querer se imaginar mais dentro da empresa."
Abancária Lúcia*, de 36 anos, trabalha em um grande banco brasileiro há 15 anos.Nos últimos três, começou a sentir dores de cabeça, ter crises do pânico e terpensamentos suicidas. O diagnóstico é depressão. 
"Fuiafastada algumas vezes pelo INSS. Em uma delas, quando voltei a trabalhar, mecolocaram para editar tabelas durante dois meses, o que não é o meu trabalho.Disseram que estavam me fazendo um favor por eu estar empregada", relata aoperadora de atendimento.
Indignadacom a situação, a bancária — que ainda está empregada — entrou com processocontra o banco em 2011 e ganhou em primeira instância. O caso, contudo, aindacorre na Justiça, uma vez que a instituição financeira recorreu.
"Nãopedi demissão porque meu marido não é registrado e tenho um filho de quatroanos. Preciso do plano de saúde e do dinheiro para comer. Fiquei traumatizada enão tenho mais condições de voltar ao mercado de trabalho por contadisso", diz.

*Osnomes das personagens foram omitidos a pedido das próprias entrevistadas(Fonte: UOL)
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