Projeto de Previdência dos militares não só manteve privilégios, como ainda criou outras vantagens, como os adicionais de habilitação e disponibilidade.| Foto: Pedro França/Agência Senado

(Por Lúcio Vaz) Projeto de Previdência dos militares não só manteve privilégios, como ainda criou outras vantagens, como os adicionais de habilitação e disponibilidade.

A reforma da Previdência aprovada em 2019 foi dura com servidores públicos civis e trabalhadores da iniciativa privada, mas não com os militares. Membros das Forças Armadas tiveram privilégios mantidos e, melhor, foram agraciados com novas vantagens no plano de reestruturação da carreira militar e do sistema de proteção social (projeto de lei 1.645/2019). A reforma foi proposta pelo governo Bolsonaro e aprovada pelo Congresso no início de dezembro.

Não exigência de idade mínima, reajuste igual ao de militar da ativa (paridade), pensão integral, pensões vitalícias para filhas maiores de idade, adicionais ao salário, ajuda de custo maior e pensão para família de militar que cometeu crimes estão entre as regalias oferecidas.

1. "Aposentadoria" bancada pelo Tesouro
Militar não precisa pagar contribuição previdenciária para financiar a própria "aposentadoria". O projeto de lei 1.645 deixa claro: “a remuneração dos militares ativos e inativos é encargo financeiro do Tesouro Nacional”. Os militares não estão enquadrados em nenhum regime de Previdência. Eles costumam dizer que não se aposentam – entram para a reserva e ficam à disposição de uma eventual reconvocação. Assim, quem banca a remuneração dos militares da reserva ou reformados são os contribuintes.

O Comando da Marinha afirmou ao blog que “a remuneração do militar inativo é um encargo financeiro da União (e não um regime previdenciário), não havendo, portanto, necessidade de contribuições para tal fim”. Segundo o Comando do Exército, “os militares das Forças Armadas nunca tiveram e não têm um regime previdenciário estatuído. As peculiaridades da carreira sempre levaram os militares a terem um tratamento diferenciado, o que não significa privilégio”.

2. Filhas maiores mantêm direito à pensão
A contribuição de 7,5% descontada da folha salarial de militares ativos e inativos é destinada a cobrir apenas as pensões dos seus dependentes. Esse percentual vai subir para 10,5% com a reforma recém-aprovada. Além disso, os pensionistas passarão a fazer a mesma contribuição. Ainda assim, essas contribuições não serão suficientes para cobrir a despesa.

Levantamento feito pelo blog, a partir de informações oficiais do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, mostra que atualmente essas contribuições cobrem apenas 14% do que recebem os pensionistas. São apenas R$ 3 bilhões de contribuições por ano para pagar R$ 21 bilhões em pensões.

Mas não vai faltar dinheiro. Outro dispositivo aprovado pelo Congresso diz que “as pensões militares são custeadas com recursos provenientes da contribuição dos militares das Forças Armadas, de seus pensionistas e do Tesouro Nacional”. Vai sobrar para a viúva, ou seja, a União.

Entre essas pensionistas estão as filhas maiores de idade, que podem ser solteiras, casadas, divorciadas ou em união estável. São quase 90 mil pensionistas, a maioria delas com mais de 60 anos, algumas centenárias. Para assegurar a pensão dessas filhas, os militares que estavam na carreira em 2001 optaram por descontar mais 1,5% da sua renda.

Mas essa conta também não fecha. Dados oficiais do Exército obtidos pelo blog mostram que essa contribuição cobre apenas 9,3% das despesas com essas pensionistas. Cerca de 70 mil militares contribuem com R$ 150 milhões por ano, enquanto o gasto anual com 24 mil filhas maiores atinge incríveis R$ 1,6 bilhão.

O Comando do Exército esclareceu que os dados são relativos a filhas maiores de militares mortos após dezembro de 2000. Até aquela data não havia uma contribuição específica para essas pensionistas. Com a reforma, as pensionistas filhas solteiras também passarão a fazer contribuição, mas não será suficiente para cobrir as despesas. Considerando todas as pensões de filhas maiores, incluindo aquelas concedidas antes de 2001, o gasto anual chega a R$ 6 bilhões por ano.

3. Pensão de militar condenado por crime
A reforma que seguiu para sanção do presidente Jair Bolsonaro mantém o pagamento de pensão à família de militar que perde o posto ou é expulso das Forças Armadas pela prática de crimes, como corrupção e tráfico de drogas, entre outros.

É o caso, por exemplo, do major-aviador Washington Vieira da Silva, que foi surpreendido na Base Aérea de Recife (PE) transportando 33 quilos de cocaína num avião Hércules da Aeronáutica com destino à França. Ele foi preso em abril de 1999 e condenado pela Justiça Federal pela prática de tráfico internacional de drogas e associação criminosa, em novembro de 2000, mas só teve o trânsito em julgado da ação decretado em maio de 2018.

O militar perdeu o posto, mas sua família passou a receber a pensão militar normalmente, como se ele tivesse sido morto em combate e se tornado um "herói de guerra". O Ministério Público Militar estima em R$ 20 milhões o gasto anual da administração pública federal com essas pensões.

O promotor militar Soel Arpini ingressou com ação civil pública propondo que a União deixasse de pagar pensões a dependentes de militares excluídos das Forças. “O Estado custeia pensão para ‘herdeiras’ de um traficante internacional. Para adjetivar tal situação, podemos defini-la como: escárnio”, diz Arpini. Mas a recomendação não foi adotada pela União.

4. Sem idade mínima
A reforma dos militares manteve um dos principais e mais vantajosos benefícios da Previdência dos militares, embora eles não reconheçam estar vinculados a um sistema previdenciário. Nesse sistema muito particular, não há exigência de idade mínima para o ingresso na inatividade, ou reserva, no jargão militar. Para os civis, agora a idade mínima é de 65 anos para homens e 62 para mulheres.

Em contrapartida, os militares poderão passar para a reserva somente após 35 anos de serviço – até então eram 30 anos.

5. Paridade e integralidade
Outra vantagem é a integralidade: o valor da pensão militar continua igual à última remuneração recebida na ativa, ou seja, antes de ser reformado. A paridade também é mantida: os inativos terão os mesmos reajustes salariais dos militares da ativa, independentemente da patente. (Fonte: Gazeta do Povo)

0
0
0
s2sdefault