Crédito habitacional fica difícil em bancos públicos e privados

Os corredores mais vazios do Feirão da casa própria, promovido pela Caixa neste fim de semana, dão uma pista sobre o pessimismo que se abateu no mercado imobiliário nos últimos meses. Desde que o banco líder no segmento anunciou aumentos nas taxas de juros e redução na cota máxima de financiamento para até 40% em imóveis usados, os compradores têm recebido uma festival de más notícias.

A análise inicial era de que a concorrência iria manter suas condições inalteradas para abocanhar uma fatia maior do mercado, mas o que se seguiu após as medidas da Caixa foi um efeito manada dos demais bancos, ainda que de uma forma bem mais sutil.

A partir de segunda-feira, o Banco do Brasil começa a aplicar suas novas taxas de juros, que subiram de 9,9% para 10,4% ao mês, mais a taxa referencial. O Itaú anunciou, na semana passada, que a redução do percentual máximo de financiamento imobiliário, de 80% para 70% do valor total do imóvel, seja ele novo ou usado. Já o Bradesco revisou sua taxa de juros de 9,6% para 9,8% ao mês em imóveis do Sistema Nacional de Habitação (SFH).

As mudanças recaíram em cheio na classe média, a obrigando a gastar mais sola de sapato e negociar em vários bancos.

Uma simulação feita pelo Canal do Crédito para um imóvel usado no valor de R$500 mil mostra que as condições variam muito. A Caixa oferece a menor taxa de juros, mas exige entrada de pelo menos R$ 250 mil, o que inviabiliza o negócio para muitos compradores.

O Bradesco tem boa taxa, mas exige parcelas maiores. O Itaú mantém o segundo menor valor da parcela inicial. “Lembrando que na hora de comparar o importante é ver o Custo Efetivo Total (CET), que engloba seguros obrigatórios e outras taxas”, orienta Marcelo Prata, fundador do Canal do Crédito.

O casal de militares Rodrigo Oliveira, 31 anos, e Flaviane Gomes, 31, está procurando um imóvel na Zona Norte e quer abrir o leque de opções na hora de contratar o financiamento. “A gente pensou em uma unidade usada por causa do tamanho, porque imóveis novos são menores. Mas para isso, teríamos que ver alguma linha de crédito sem ser a Caixa”, afirma Rodrigo.

O taxista Leandro de Barros, 38, afirma que a mudança nas condições da Caixa foram um golpe para ele e a esposa, Ana Paula Guzzo, 37.

“Complicou muito. No imóvel usado, você consegue ter mais liberdade para negociar com o proprietário. Nas construtoras você é jogado aos leões. A compra é cheia de armadilhas”, afirma.

Esperar ou fechar negócio? Especialistas divergem

Se por um lado o crédito no Brasil passa por um momento de escassez, por outro, o desaquecimento do mercado tem impedido a alta de preços no setor de imóveis. Após o boom de preços ocorrido nos últimos anos, o momento agora é de acomodação e, em alguns casos, até de queda.

Diante disso, é melhor fechar negócio ou esperar uma condição ainda mais favorável para o comprador? Para Marcelo Prata, do Canal do Crédito, este pode ser um bom momento para comprar. Mesmo com os juros mais altos, ele lembra que existe portabilidade nos financiamentos, permitindo que o mutuário migre para outro banco se aparecerem condições mais favoráveis.

“Se a gente olhar só para a variável dos juros, de fato não é um momento favorável. Mas hoje você consegue negociar um preço melhor do imóvel em função da baixa liquidez. A vantagem é que o financiamento não é mais um casamento para a vida toda. O comprador tem autonomia para migrar para outro banco”, afirma Prata.

O professor Keyler Carvalho Rocha, da FEA-USP, aconselha quem tiver tempo disponível a esperar, pois ele prevê uma queda maior de preços no segundo semestre deste ano. “As construtoras não podem ficar com estoque, pois isso gera um custo muito alto para elas, e os imóveis estão ficando prontos em um mercado mais recessivo”, afirma. “E se o preço do imóvel novo cair, o do usado também cai”, explica.

Leonardo Schneider, vice-presidente do Sindicato da Habitação do Rio de Janeiro (Secovi-RJ), também vê queda de preços nos próximos meses. “A tendência é piorar, ainda não estamos na fase de subir a montanha. As construtoras reduziram seus lançamentos, mas ainda há muito estoque e elas vão ter que fazer ofertas mais agressivas”, diz.

As mudanças também devem mexer na dinâmica do mercado de aluguéis. “Quem estava economizando para comprar a casa própria poderá migrar para o aluguel por conta dessa dificuldade de financiamento. Comprar imóvel é uma decisão importante que requer cautela. Já a locação é uma necessidade urgente”, diz Edison Parente, vice-presidente comercial da Renascença Administradora.

A situação atual provoca análises discrepantes sobre o papel dos bancos privados nesta nova configuração e sobre o comportamento dos preços de agora em diante. Para Marcelo Prata, “não há dúvidas” de que a Caixa vai perder mercado.

Já para o professor da Faculdade de Economia da USP, Keyler Carvalho Rocha, nem sempre o financiamento é um produto interessante para os bancos. “É uma aplicação de longo prazo com juros baixos. Os bancos não vão querer ocupar todo este espaço. Eles só vão procurar clientes de médio e alto padrão que tenham um bom cadastro”, avalia.

Construtoras estão na expectativas de mudanças

Prejudicadas pelo desaquecimento no mercado, as construtoras estão pressionando o governo por mudanças. O principal pleito é a liberação de uma fatia maior dos recursos da poupança para os bancos. Nesta semana, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, admitiu que o governo está estudando a medida.

No setor de habitação popular, a pressão é pelo aumento do valor do imóvel que pode ser enquadrado no ‘Minha Casa, Minha Vida’. Atualmente, cada cidade tem um limite de preços que podem ser enquadrados no programa, com o teto de R$ 190 mil. Para as construtoras, o teto deveria ser mais alto.

“No Norte Fluminense, o limite é de R$ 115 mil, valor muito defasado. Qualquer imóvel que passa desse valor perde os subsídios e os juros”, afirma Rubens Menin, presidente do Conselho de Administração da MRV. (Fonte: O Dia)
0
0
0
s2sdefault